A SOLUÇÃO DO ILUMINISMO
Chegamos agora a outro ponto crucial na formação da visão moderna do mundo. Tínhamos apelado para a ciência para a descoberta de respostas para as nossas maiores perguntas existenciais e espirituais, mas a ciência tornou-se consumida por um enfoque puramente laico e materialista. Quem poderia dizer quanto tempo ela demoraria para descobrir o sentido mais elevado da vida humana?
Era evidente que nós, ocidentais, precisávamos de um novo sentido, um novo estado de espírito a que pudéssemos nos agarrar nesse ínterim — e, mais importante, que ocupasse a nossa mente. E parece que nesse momento a decisão coletiva foi levar a nossa atenção totalmente para o mundo físico, assim como a ciência estava fazendo. Afinal, a ciência estava descobrindo um rico tesouro de recursos naturais à nossa disposição — e podíamos usar esses recursos para melhorar nossa situação econômica, para conseguirmos mais conforto nesse mundo material. Poderíamos ter que esperar pelo conhecimento a respeito da nossa verdadeira
situação espiritual, mas, enquanto esperávamos, poderíamos conseguir mais segurança material. A nossa nova filosofia, embora temporária, era um passo à frente no progresso humano, um compromisso com o aperfeiçoamento da nossa vida e da vida de nossos filhos.
Essa nova filosofia, no mínimo, nos tranquilizava. A carga de trabalho nos mantinha ocupados, afastando a nossa atenção do fato de que o mistério da morte, portanto o da própria vida, ainda se mostrava enorme e inexplicado. Algum dia, no final da nossa existência terrena, teríamos que enfrentar as realidades espirituais, fossem elas quais fossem. Enquanto isso, porém, limitávamos nosso enfoque aos problemas da existência material cotidiana e
tentávamos fazer do próprio progresso, tanto pessoal quanto coletivo, a única razão para a nossa curta vida. E essa se tornou a postura psicológica no início da era moderna.
Basta uma olhadela rápida no final do século XX para vermos os grandiosos resultados desse enfoque restrito ao progresso material. Em poucos séculos, exploramos o mundo, fundamos nações e criamos um imenso sistema de comércio global. Além disso, cientistas venceram doenças, desenvolveram fantásticas formas de comunicação e mandaram homens à Lua.
No entanto, todas essas conquistas tiveram um preço alto. Pelo progresso, nós exploramos o meio ambiente quase ao ponto da sua destruição. E pessoalmente podemos perceber que, em certo ponto, o nosso enfoque nos aspectos econômicos da vida tornou-se
uma obsessão, usada para afastar a ansiedade da incerteza. Fizemos da vida material e do progresso dirigido pela nossa lógica a única realidade que permitíamos entrar em nossa mente.
Finalmente, em meados do século XX, a cultura ocidental começou a despertar dessa preocupação. Paramos para olhar em volta e começamos a compreender o nosso lugar na História. Ernest Becker ganhou um Prêmio Pulitzer por seu livro The Denial of Death porque mostrou claramente o que o mundo moderno tinha feito a si mesmo psicologicamente. Nós tínhamos limitado nosso enfoque à economia material e, durante todo esse tempo, nos
recusamos a aceitar a idéia de uma experiência espiritual mais profunda, porque não queríamos que nos lembrassem o grande mistério que é esta vida.
Acredito que é por isso que as pessoas mais velhas eram abandonadas em sanatórios: elas nos lembravam aquilo que tínhamos empurrado para longe da nossa consciência. A necessidade de nos esconder do mistério que nos aterrorizava é também a razão por que o nosso senso comum acha tão estranha a crença num universo onde a sincronicidade e outras capacidades intuitivas são reais. O nosso medo explica por que, durante tantos anos, os indivíduos que experimentavam fenômenos misteriosos — sincronicidade, intuição, sonhos proféticos, percepções extra-sensoriais, experiências no limiar da morte, contato com anjos, e
tudo mais —, que sempre ocorreram na existência humana e até continuavam na era moderna, eram tratados com tanto ceticismo. Falar sobre essas coisas, ou até mesmo admitir que elas eram possíveis, colocava em risco a nossa teoria de que o mundo material era tudo que existia.
VIVENDO UM PRESENTE MAIS LONGO
Podemos ver, portanto, que a percepção da sincronicidade em nossa vida representa nada menos que um despertar coletivo da visão materialista do mundo, que durou séculos. Agora, quando contemplamos a existência moderna com suas maravilhas tecnológicas, podemos ver este mundo a partir de um ponto de vista psicológico mais revelador.
Com a decadência da Idade Média, perdemos a sensação de certeza a respeito de quem éramos e o que significava a nossa existência; assim, inventamos um método científico de pesquisa e o encarregamos de descobrir a verdade da nossa situação. Mas a ciência parecia fragmentar-se em mil faces, incapaz de trazer de volta de imediato uma imagem coerente.
Como reação, afastamos a ansiedade voltando o nosso enfoque para iniciativas práticas, reduzimos a vida a seus aspectos econômicos e finalmente entramos numa obsessão coletiva, com os aspectos prosaicos e materiais da vida. Como vimos, os cientistas apresentaram uma visão do mundo que reforçou essa obsessão e, durante muitos séculos, eles próprios ficaram perdidos dentro dela. O preço dessa cosmologia limitada foi o estreitamento da experiência humana e a repressão da nossa percepção espiritual mais elevada — uma repressão que agora estamos finalmente vencendo.
O desafio é nos esforçarmos sempre para manter na consciência essa maneira de ver a História, especialmente quando o materialismo, ainda influente, tenta nos atrair de volta para
a antiga visão. Temos que ter em mente onde estamos, a verdade da era moderna, e fazer disso parte de todos os momentos da nossa vida — pois é a partir dessa sensação intensificada de estarmos vivos que podemos nos abrir para o próximo passo da nossa viagem.
Quando olhamos com um olhar novo, vemos que a ciência não fracassou por completo; sempre houve na ciência uma corrente subjacente que silenciosamente ultrapassava a obsessão material. A começar nas primeiras décadas do século XX, uma nova maneira de pensar começou a formar uma descrição mais completa do universo e de nós mesmos — uma descrição que finalmente está abrindo caminho para a consciência popular.
A Visão Celestina - James Redfield